terça-feira, 16 de novembro de 2010

A espinha no lábio

Ela estava com uma espinha no lábio.

Há tempos meu olhar a acompanha quando ela passa. Beleza natural, cabelos morenos, olhos desenhados e marcantes, seu sorriso é de dentes brancos e alinhados, inseridos numa boca grande normalmente em tons discretos.
E ela tinha uma espinha no lábio.

A nossa ultima aula se iniciou com uma apresentação de trabalho dela. Ótimo. Pude olhar a vontade sem que ela percebesse que enquanto falava, eu analisava o quanto é bonita...
E ela tinha uma espinha no lábio.

Veste-se discretamente. E realmente, não precisa deixar de ser discreta para chamar atenção. Para ME chamar atenção. Enquanto fala, para em pé, cruza as pernas e os braços, encaixa o quadril e curva o tronco para trás, numa posição em que talvez espere outros braços lhe envolvendo os ombros, acompanhados de um leve cheiro no pescoço durante um longo abraço por trás. Por óbvio: se imaginei tal situação, é porque desejei tal situação.
E ela tinha uma espinha no lábio.

Estes dias a vi chorar. Lacrimejava tornando suas bochechas um pouco maiores e ressaltando a cor de seus olhos. Linda. Confesso: não me senti triste por vê-la chorando, me senti triste por vê-la chorar e não poder oferecer-lhe o aconchego de meu peito para que ela pudesse abafar o ouvido. Senti-me triste por não poder lhe demonstrar o quanto poderia protegê-la em meio aos meus braços. Senti-me triste por não poder oferecer-lhe o colo, a mão, um cafuné demorado, um afago quente no rosto e um sorriso.
Já tem quem faça isto. Que saco.
Mas ela tinha uma espinha no lábio.

É meiga, dá para notar. Encanta pela leve timidez e pela maneira sutil que deixa transparecer que precisa de carinho e proteção. Parece-me gostar de gentilezas masculinas verdadeiras, de sinceridades, de confianças mútuas e de fazer planos. Provável goste de programas a dois, de rir, de uma boa janta e de proximidades ao conversar. Espera talvez alguém que acredite nela, tanto rotineiramente quanto no seu potencial.
Dei uma de vidente agora. Baseado apenas no que aparenta. Sem esquecer a tal espinha.

Falando em encantar, é uma mulher que não tem noção do quanto encanta. Não sabe de verdade. Talvez sua modéstia não deixe. Tem um nome comum, um tipo comum, se veste de maneira comum. Estuda um curso comum, tem um emprego comum, mora em uma cidade comum e fala com um tom de voz comum. Enxerga-se tão comum. Mas o seu brilho nem de perto é comum. Num mundo onde todas tentam cada vez mais se montar e parecerem iguais, e o que é natural, comum e simples é tão raro, ela se destaca, e tem seu papel de destaque na minha semana. É comum, e é única. E gostaria de ser única, sem saber que já é.

O porquê da espinha?
Porque a menina estava lá, sentada ao meu lado, aliviada pela evidência bem sucedida frente aos colegas de aula, sorrindo levemente e cheirando maravilhosamente bem. A espinha existia claro, mas era apenas mais um micro detalhe daquela mulher que este mega-detalhista que vos escreve notou. Serve apenas para que fique claro o quanto a observo, o quanto a memorizo, o quanto a imagino.
Gostaria de conhecê-la melhor.
Pena que tem quem a comprometa. E sou moço certo.

Que saco novamente...