quarta-feira, 25 de outubro de 2006

Simples assim...

Brigas. Como sinto falta delas.
Parece loucura mas, quando um relacionamento definitivamente marcante nas nossas vidas termina, vão e vêm à lembrança os momentos bons e ruins, incessantemente.
As brigas entre os casais, segundo definições retiradas da sabedoria popular, são nada mais, nada menos que “ajustes finos” do relacionamento. Metaforicamente, será que uma relação poderia ser comparada àqueles antigos aparelhos de televisão, que vinham com botões redondinhos que girávamos de um lado para o outro pra encontrar a “sintonia fina” dos canais? Seria bom que existisse algum dispositivo deste tipo, que exorcizasse os fantasmas com apenas uma girada. Captasse as freqüências. Alinhasse o vertical e o horizontal. Simples assim.
Mas se existisse tal botão na relação de um casal, talvez não descobríssemos como são úteis aquelas linhas que passam sem parar, a barulheira da estática, a cor indo e voltando... E o quanto faz falta esse movimento quando tudo termina. Como sinto falta de brigar...
Não, a loucura ainda não me atingiu – eu disse, ainda. Com meu raciocínio completamente são posso elencar, do meu último relacionamento, uma penca de brigas acontecidas e quase todos os motivos que levaram a elas. No entanto, pensando bem, isto seria um exercício de paciência um tanto embaraçoso. E não tenho a mínima intenção de me expor como as nádegas de uma dançarina de pagode-axé-funk Argh.
Mas é preciso que se dê alguma informação básica pra que vocês entendam o que eu quero dizer. Atualmente estou sozinho, naquele marasmo rotineiro e satisfatório - de casa para o trabalho, do trabalho para casa, eventualmente um engarrafamento na BR 116, uma paradinha em torno da minha velha mesinha de centro, de pátina cor de areia, pra reunir os amigos e um chimarrãozito. Ou seja, nada além do corriqueiro.
Mas quando havia a possibilidade de brigar com ela, todos os dias eram diferentes. Sempre algo novo me causava preocupação e aquela adrenalina inesperada. Mais rápido do que o Ligeirinho, os “eu te amo” viravam “eu te odeio”. Andale, andale, arriba!!!
Uma dúzia pelo dinheiro, duas por ciúmes, duas e meia pela falta de carinho e sexo. Sem contar aquelas clássicas, motivadas pelo o que eu considero nada: toalha molhada em cima da cama, a famosa tampa do vaso sanitário... Enfim.
Não que eu seja algum maníaco sadomasoquista que ache benéfico irritar ou ser irritado pelo cônjuge, mas na falta da “sintonia fina”, uma briguinha consciente acalma os ânimos, seja lá quais forem eles. E me vem à lembrança agora o caso dos meus avós maternos: segundo a minha mamãe, foram 70 anos de convivência antes de falecerem felizes e terrivelmente apaixonados um pelo outro. Beijando-se, amando-se e respeitando-se por todo este tempo sem nenhuma histeria... Bem, não é politicamente correto desconfiar das mães.
Mas os anos vão passando, as modas vão mudando, o mundo não pára de correr os 200m rasos e sinto falta de estar continuamente num ringue de boxe. Ou talvez, tal qual uma síndrome de abstinência, não tenho colhões para atingir um outro estado, de viver com alguém que não me crie problemas. O fato é que ainda não encontrei o chinelo velho que vá se encaixar no pé deste corpinho carente até do carinho do cachorro. A dúvida fatal é: a gente procura e experimenta, ou senta e espera este “tesouro” de pessoa? E lá vai o mundo quebrando mais um recorde a cada nova competição. Pára que eu quero descer.
Acho que sinto falta das brigas justamente na falta do que sentir falta. É claro que o “lance” dos parâmetros de relacionamentos que eu tive até hoje influenciam também, já que nunca tive um relacionamento considerado “tranqüilo”. Por inúmeras razões, acho que ainda não encontrei o zíper da minha jaqueta, alguém que “feche” comigo sempre junto de mim.
Ok, ok. Como estou plenamente são das idéias, também não dá pra ignorar o fato do lado ruim de brigar. É estressante só de pensar. Talvez esteja aí a resposta, precisamos todos de uma válvula de escape. Assim como o Brasil encontrou o carnaval pra aliviar mais um ano de escândalos políticos eu, com meus ínfimos ardores existenciais, cheguei à conclusão que preciso brigar de vez em quando. E o que seria mais civilizado do que sair se chacoalhando pra gringo na avenida? Dar murro em porteiro de boate?
E nisso, meus pensamentos são interrompidos com a entrada esbaforida da pobre Arcângela, minha empregada. “Seu Rafael, desculpe-me pelo acidente, mas eu acabei de queimar uma de suas camisas. Mas também... Esse tecido é tão vagabundo, a camisa inteira é tão fraquinha...”...
Ah! Quanto tempo eu não sentia o sangue subir assim...
- Sua... Sua... Sem coração! Como tem coragem de assassinar e desdenhar uma das minhas queridas Fernando de Carvalho! Tu não me respeitas não!? O que é que fiz pra tu fazeres isto para mim!? Eu não mereço isto!!! Tu nunca me trataste bem....! Tu nunca me deste carinho!!!! Ahhhhhhhh!!!!!
- Eu hein, seu Rafael!? Tudo bem que eu tenha queimado e estragado uma camisa cara do senhor... Mas já tenho o Mário pra me cobrar tudo isso aí... Assim não dá, vai arranjar uma mulher!
O som da batida da porta encerrou a discussão. E eu, atônito comigo mesmo, fiquei pensando na sapiência da Arcâgela...

Um comentário:

lu castilhos disse...

nooossa!! teus textos são ótimos rapaz!!

posso perguntar como descobriste o meu blog?? (ops, se não podia já perguntei)