Eu vinha dirigindo pela terceira perimetral, quase chegando a esquina da Carlos Gomes com a Plínio Brasil Milano. Era um daqueles dias intermináveis, repleto de compromissos estafantes-estressantes-demorados. Pensava em todas as minhas tristezas e revoltas, de uma maneira tão ruim, tão negativa, coisa que só quem tem crenças de injustiça e fracasso na cabeça consegue entender. Enfim, eu estava tão triste, tão insatisfeito com tudo, que resolvi tentar me distrair um pouco.
Liguei o rádio.
A primeira música que tocou, mais especificamente em uma rádio muito popular (nos dois sentidos) de Porto Alegre, é uma música que não me tem uma melodia estranha, ao contrario, era uma melodia ao mesmo tempo heróica e grudenta, e que dizia palavras de fácil entendimento. Me parece até que esta música é tema de novela (veja bem, eu disse ME PARECE, mas posso estar errado, pois não assisto novelas desde “Roque Santeiro”. Aquilo sim que era novela, não estes folhetins que se resumem a Leblon, bossa nova e Helenas). Não sei quem a canta, e nem sei o nome da canção, só me lembro de uma parte de seu refrão meloso:
“ Sempre que quiser abrigooo.....eu vou te daaaaarrr.....IÉIEIÉÉÉÉIÉÉÉÉIIIIIIII.....”
Naquele mesmo momento, a sensação de coração grande dentro de um peito apertado me veio, e se eu não me cuidasse, poderia até preocupar os outros motoristas parados naquela sinaleira com minha expressão de choro compulsivo.
Óbvio, resolvi trocar de estação. A música da estação seguinte era uma música linda, de um cantor e compositor que está entre os 10 mais-mais da minha lista particular de intérpretes brasileiros. Milton Nascimento. Pena que ela veio em má hora.
Eu já tristonho, chorando, derrepente o refrão veio através dos alto-falantes atingindo um cruzado direto na minha cabeça:
“ Amigo é coisaaa....pra se guardar...do lado esquerdo do peeeitoooo....”
Passei a não me importar com os outros motoristas, que me olhavam insistentemente, como que quisessem oferecer ajuda.
Corri com o dedo no botão do rádio para mudar novamente de estação.
O “dial” parou na freqüência de uma conhecidíssima rádio de pagode (um dos meus grandes defeitos é infelizmente não saber dançar pagode, e por não saber dançar, não conseguir me interessar por este tipo de música, mas as acho ótimas), resolvi escutar o que aquela canção de ritmo simples e bem executada por seus intérpretes tinha a me dizer.
Começou mal:
“Apostei com fé em nosso amor...”
Já atolou com tudo...pensei.
“O nosso amor é de se invejar...”
Atolou mais ainda.
Chorando, dirigindo e procurando por outra rádio, lembrei-me que a tempos não sinto o que é ter um amor de despertar inveja nos outros. Mas também, vai saber. Derrepente tinha gente que sentia inveja até dos meus fracassos (há sempre alguém em estado pior, máxima verdadeiríssima).
Cheguei a Pop Rock, procurando claro, por alguma piada do Cafezinho (Piiiiiingos de café!). Acabei achando uma música de uma banda gaúcha que eu respeito muito, e da qual já fui espectador de uns 10 shows. Nenhum de Nós.
“Diga a ela que você me viu – que eu parecia muito bem – apesar de tantas noites vazias – tantas madrugadas... vendo tv... na verdade dias intermináveis...”
E como aquele dia estava sendo interminável. E quantas madrugadas eu passei vendo tv, procurando meus pedaços nos documentários do Discovery Channel, ou em algum filme do Telecine Cult ou do People + Arts. E claro, quantas vezes desejei que alguém me visse, para dizer para qualquer de uma das minhas algozes que eu estava bem (mesmo que não fosse verdade), na esperanças que uma pontinha de inveja fosse levantada, ou talvez até um desejo de conversa (o velho e banal: - “Como é que tu ta?”).
Felizmente tudo já passou.
A vontade de mudar de sintonia foi maior do que mim. Mudei. Cheguei a uma rádio desconhecida, num dial estranho (87-ponto-alguma coisa), mas que tocava uma das músicas de minha vida. “Everybody hurts” do R.E.M.. Minha dificuldade em inglês sempre foi determinante quando eu escuto uma música qualquer que esteja neste idioma, mas desta vez resolvi prestar atenção na letra. E tive uma grata surpresa. Permitam-me, por gentileza, ser um pouco mais extenso desta vez. (Já traduzido):
“Quando o dia é longo - E a noite, a noite é somente sua - Quando você tem certeza [que] já teve o bastante desta vida, - Bem, persista... Não desista de si mesmo - Pois todo mundo chora - E todo mundo sofre Às vezes... Às vezes tudo está errado - Nesse momento é hora de cantar junto - Quando seu dia é noite – sozinho - (Agüente, agüente) - Se você tiver vontade de desistir - (Agüente...) Se você achar que teve demais desta vida, - Bem, persista... Pois todo mundo sofre - Consiga conforto em seus amigos - Todo mundo sofre...”
Imediatamente, o mundo mudou lá fora ganhou um novo contexto, com cores, cheiros e iluminação diferente. Minha cabeça deu uma guinada violenta e o olhar foi redirecionado. Michael Stipe mal começou a cantar e o olhar foi redirecionado. Música faz isso com a gente, às vezes. Nos atira para o ar de repente, sem aviso. É isso. Rouba o chão escaldante e estende um tapete de nuvens reconfortantes no lugar.
Meus pulmões tomaram um outro fôlego, e o choro que antes estava sendo de desabafo por um período difícil, seja do dia, da semana, ou da minha vida, tornou-se um choro de emoção por saber que tenho a quem recorrer, tenho conforto, tenho meus portos seguros em alguns lugares.
Entendi que o contexto importa muito, e a felicidade, realmente, se encontra em pequenas coisas.
Enfim, aquela música acabou, o dia acabou, a tristeza passou e a vida continua. Mas só Ele sabe como ela continuará.
Eu apenas dirijo. Tanto o carro quanto a vida. Só espero que o rádio toque músicas boas...
quarta-feira, 6 de dezembro de 2006
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2 comentários:
oi!
Td bom?
Beijocas!
ótimo lindinho!
Adorei!
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